Louco, sim, louco porque quis a
grandeza
Qual a sorte não dá.
Não coube em mim com certeza;
Por isso onde o areal está
Ficou meu ser que houve, não o que há
Minha loucura, outros que me a tomem
Com o que nela ia.
Sem a loucura que é o homem
Mais que besta sadia,
Cadáver adiado que procria?
Autopsicografia
O Poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que leem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não só as duas que ele teve,
Mas só a que eles têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.
Poema
de Alberto Caieiro (heterônimo de
Fernando pessoa)
Quando vier a primavera,
Se eu já estiver morto,
As flores florirão da mesma maneira
E as arvores não serão menos verdes que na primavera passada.
A realidade não precisa de mim.
Sinto uma alegria enorme
Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma.
Se soubesse que amanhã morria
E a primavera era depois de amanhã.
Morreria contente, porque ela seria depois de amanhã,
Se esse é o seu tempo, quando havia ele de vir senão no seu tempo?
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.
Por isso se morrer agora morro contente,
Podem rezar em Latim sobre o meu caixão, se quiserem.
Se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.
Não tenho preferencias para quando já não puder ter preferencias.
O que for, quando for, é que será o que é.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Fernando_Pessoa
https://www.youtube.com/watch?v=0YGB5u2u8kA